Análise heurística: o que é, como fazer e os benefícios para o projeto

Análise Heurística é um método rápido e eficiente de analizar a performance e a usabilidade de determinado produto, serviço ou interface. Mas como ela deve ser feita? Quais os passos para realizar uma análise dessas e como evitar a subjetividade excessiva nesse processo?

Fabricio Teixeira

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– Análise Heurística? Que isso?! Não vou saber fazer isso não.

Heurística é uma palavra estranha. Pode assustar na primeira vez que você ouve. Mas se você olha o significado da palavra no dicionário na wikipedia, percebe rapidamente que o conceito é mais simples do que parece.

“Heurística é um método ou processo criado com o objetivo de encontrar soluções para um problema.”

Opa, isso eu sei fazer.

“É um procedimento simplificador (embora não simplista) que, em face de questões difíceis envolve a substituição destas por outras de resolução mais fácil a fim de encontrar respostas viáveis, ainda que imperfeitas. Tal procedimento pode ser tanto uma técnica deliberada de resolução de problemas, como uma operação de comportamento automática, intuitiva e inconsciente.”

No contexto de UX, uma análise heurística (também conhecida como avaliação heurística) é uma avaliação rápida, barata e prática de um produto, interface ou serviço. Normalmente é feita por um especialista de UX que leva em conta a bagagem e experiência que possui para rapidamente determinar o que está e o que não está funcionando em um sistema.

O método foi apresentado por Rolf Molich e Jakob Nielsen em 1990, e desde então tem sido usado em diferentes escalas e adaptado de diferentes formas por profissionais de UX e Usabilidade ao redor do mundo.

As vantagens da Análise Heurística

A primeira grande vantagem da Análise Heurística é a rapidez. Com poucas horas de trabalho você consegue gerar um bom volume de feedback sobre determinada interface. Também não requer muitas pessoas, ou muitos recursos, ou nenhum software especial.

A segunda vantagem é que ela pode ser feita em diversos momentos do projeto. Se você está trabalhando em um projeto de redesign, por exemplo, pode fazer uma análise dessas logo no começo do projeto para entender onde estão os problemas de design e usabilidade e ajudar o restante do time a não repetir os mesmos erros na nova versão que vocês estão desenhando. Pode ser feita também nas etapas mais avançadas, para avaliar um protótipo que está sendo testado, ou ainda para analisar a experiência do usuário em produtos concorrentes ao seu.

Como fazer uma análise heurística

O processo é bastante flexível e você pode adaptar alguns dos pontos abaixo para as necessidades específicas do projeto no qual está trabalhando. No geral uma análise heurística é executada na seguinte ordem:

  1. Entendendo os usuários
  2. Definindo as heurísticas de usabilidade
  3. Avaliando a experiência
  4. Reportando os resultados

1. Entendendo os usuários

Defina quem eles são e quais os seus objetivos ao interagirem com aquele produto. O especialista que realizará a análise precisa ter em mente o mesmo ponto de vista dos usuários e saber quais são seus objetivos — e os problemas que eles querem resolver ali. Estude bem o documento de personas e entenda em profundidade as especificidades da audiência. Se preciso for, converse com alguns usuários antes de começar a análise.

Defina também quais as tarefas mais comuns que os usuários realizam ali. Isso pode ajudar a definir o escopo da análise; em alguns casos o sistema é tão robusto e complexo que você precisará priorizar os fluxos, telas e tarefas mais importantes para serem avaliados. Nesse processo de definição do escopo, olhe para as métricas do produto (para ver quais delas estão sendo mais acessadas pelo usuário) e converse também com os stakeholders do projeto — eles provavelmente terão uma boa noção de quais os momentos mais importantes ou relevantes da experiência.

2. Definindo as heurísticas de usabilidade

Existem vários modelos online que podem ser seguidos para avaliar a usabilidade do produto — das clássicas “Heuristics for User Interface Design” do Jakob Nielsen (escritas em 1995 e válidas até hoje), até guias mais práticos como os Principles of Interaction Design, do Bruce Tognazzini.

Para facilitar, copiei aqui os 10 critérios de Nielsen para avaliar a usabilidade de um sistema:

  • Visibility of system status. The system should always keep users informed about what is going on, through appropriate feedback within reasonable time.
  • Match between system and the real world. The system should speak the users’ language, with words, phrases and concepts familiar to the user, rather than system-oriented terms. Follow real-world conventions, making information appear in a natural and logical order.
  • User control and freedom. Users often choose system functions by mistake and will need a clearly marked “emergency exit” to leave the unwanted state without having to go through an extended dialogue. Support undo and redo.
  • Consistency and standards. Users should not have to wonder whether different words, situations, or actions mean the same thing. Follow platform conventions.
  • Error prevention. Even better than good error messages is a careful design which prevents a problem from occurring in the first place. Either eliminate error-prone conditions or check for them and present users with a confirmation option before they commit to the action.
  • Recognition rather than recall. Minimize the user’s memory load by making objects, actions, and options visible. The user should not have to remember information from one part of the dialogue to another. Instructions for use of the system should be visible or easily retrievable whenever appropriate.
  • Flexibility and efficiency of use. Accelerators — unseen by the novice user — may often speed up the interaction for the expert user such that the system can cater to both inexperienced and experienced users. Allow users to tailor frequent actions.
  • Aesthetic and minimalist design. Dialogues should not contain information which is irrelevant or rarely needed. Every extra unit of information in a dialogue competes with the relevant units of information and diminishes their relative visibility.
  • Help users recognize, diagnose, and recover from errors. Error messages should be expressed in plain language (no codes), precisely indicate the problem, and constructively suggest a solution.
  • Help and documentation. Even though it is better if the system can be used without documentation, it may be necessary to provide help and documentation. Any such information should be easy to search, focused on the user’s task, list concrete steps to be carried out, and not be too large.

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3. Avaliando a experiência

Essa é a etapa “mão na massa”, onde você vai fazer a análise propriamente dita da experiência.

Na prática, você vai navegar pelo produto como um usuário navegaria — tentando completar tarefas e passando pelos diferentes momentos da experiência que você e seu time definiram como prioritárias para a análise. À medida em que vai fazendo isso, você vai tirando screenshots (ou gravando vídeos) e anotando os problemas que encontrou no meio do caminho. Documente também a gravidade do problema (crítico > grave > menor > boa prática) para garantir que vocês consigam priorizar os mais importantes mais para frente.

4. Reportando os resultados

Explique quais os critérios usados para a análise heurística, quem foi o especista (ou os especialistas) que analisou a experiência, e coloque tudo em um formato apresentável para dividir com o restante do time. Em alguns casos, o próprio especialista grava um vídeo dele mesmo navegando pelo produto enquanto faz comentários sobre o que funciona e o que não funciona ali. Lembre-se também de criar um sumário executivo que resume em um slide os principais aprendizados depois da análise.

Heurísticas só funcionam quando feitas por especialistas

Tenha em mente que uma análise heurística só faz sentido quando é feita por um expert na área. Aliás, um expert em duas áreas: tanto em usabilidade, quanto na indústria/negócio que está relacionado ao produto.

  • O método só funciona bem quando feito por um profissional de UX que seja realmente considerado um especialista — com vários anos de experiência em desenhar, testar e projetar interfaces daquele tipo ou para aquela plataforma. Um profissional com menos experiência pode acabar fazendo uma análise mais subjetiva do que a recomendada. Para evitar esse problema de subjetividade, o ideal é que você utilize mais de um avaliador — uma avaliação feita por um profissional normalmente pega 20% dos problemas de usabilidade de um sistema. O número recomendado é de 3 a 5 profissionais.
  • O profissional deve estar também familiarizado com aquela indústria. Se vocês estão redesenhando um aplicativo de planejamento de finanças pessoais, por exemplo, é preciso que o profissional já tenha trabalhado em outros projetos desse tipo ou que esteja intimamente familiarizado com as necessidades e restrições específicas desse nicho. Caso contrário, há o risco de que as sugestões da análise heurística acabam sendo impossíveis de serem executadas, ou que elas não façam sentido do ponto de vista dos objetivos de negócio da empresa.

Combine heurística com outros métodos de avaliação de usabilidade

A análise heurística é um método eficaz e rápido de encontrar os problemas de usabilidade mais básicos de um sistema. Tenha a análise heurística como uma carta na manga, mas nunca confie somente nela para avaliar a performance de um produto.

É importante que você teste o produto com usuários reais, que têm necessidades reais e tarefas reais que precisam realizar. Grande parte dos problemas de usabilidade só aparecem nessa hora, quando o produto é colocado à prova no contexto real de uso e com as pessoas certas.

Aliás, um rápido teste de usabilidade após a análise heurística pode ajudar a descobrir quais dos problemas levantados na análise são realmente encontrados pelos usuários. Quando você começa a comparar os resultados de uma avaliação heurística com os de um teste de usabilidade, é possível traçar a intersecção desses dois mundos e definir quais são realmente os problemas mais urgentes de serem corrigidos. Um método complementa o outro; o especialista e o usuário, trabalhando juntos e dando inputs juntos para melhorar a experiência do seu produto.

Até o próximo post.

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